Nota: 10
Poucas coisas me deixam mais ansioso do que a estreia de um
filme de Quentin Tarantino. E o melhor de tudo é que não importa o quão grande
sejam minhas expectativas, essa verdadeira lenda viva que é Tarantino sempre
consegue superá-las. Em Bastardos Inglórios ele extasiou o mundo proporcionando
uma merecida vingança judia ao terror nazista. Agora, em Django Livre é a vez
dos escravos americanos darem o troco sobre o domínio de seus capatazes.
Ambientada no velho oeste americano há dois anos do início
da Guerra Civil (que culminaria na alforria da escravidão na América), Dr. King
Schultz é um dentista que há cinco anos deixou de exercer a função para se
dedicar há um novo emprego: o de caçador de recompensas. Numa de suas caças,
ele precisava de alguém que conheça os irmãos Brittle, três procurados dos
quais ele sequer sabia como era o rosto. O único que pode ajuda-lo nessa tarefa
é Django, um escravo que tem um doloroso passado causado pelos três irmãos: sua
esposa foi tirada de si e vendida para outra fazenda. Django e Schultz logo
ficam amigos e o dentista/caçador propõe ajuda-lo a recuperar sua mulher,
Brünhilde, agora escrava na fazenda Candyland, propriedade do excêntrico e
perverso Calvin Candy.
O roteiro, escrito pelo próprio Tarantino, é empolgante logo
em seu início, com a cena da compra (se é que é possível chamar aquilo de
compra) de Django que gruda qualquer um na poltrona. Além disso, essa cena
inicial já contém duas das mais famosas marcas de Tarantino, presentes em
diversas outras cenas: seus diálogos longos, inteligentes e reveladores, e sua
típica violência exagerada, com tiros que explodem cabeças e fazem suas vítimas
voar muitos metros de distância.
Alguns detestam isso no diretor, eu amo. Pra mim não há
exagero nas suas cenas violentas. Acredito que Tarantino as elabore exatamente
do modo como nós enxergamos qualquer cena do tipo em nosso cotidiano. Para
exemplificar, imagine que você presencie uma briga entre dois homens muito
fortes, se um golpeia o outro com tamanha força que este recua com o golpe,
dificilmente você ou qualquer outra pessoa vai descrever esse evento exatamente
do jeito que eu descrevi agora. O mais provável é que seja dito “ele deu um
soco no cara que ele voou longe”. Bom, assim é o cinema de Tarantino.

Outro ponto forte do diretor é sempre contar com um elenco
excelente em suas atuações. A começar pelo protagonista, vivido por Jamie Foxx,
ousado e nas suas próprias palavras, intrigante sempre desconcertando seus
algozes. A voz suave de Foxx mantém oculto o terror que Django representa em
ação. Não bastasse isso, sua caracterização como a barba projetada pra frente,
salienta ainda mais sua ousadia, ou petulância como preferem os brancos da
época.


Mas apesar do seu desempenho fantástico, ninguém supera a melhor atuação da vida de Leonardo DiCaprio. Calvin Candy é o típico playboy mimado que na ausência de algo útil a fazer, usa toda a sua fortuna e crueldade para encontrar algum sentido pra sua existência, no caso, uma versão a la UFC de briga de escravos. Candy (que nome sugestivo) é adepto da frenologia, uma pseudociência que diz ser possível determinar o caráter, grau de criminalidade e personalidade de uma pessoa através do formato de sua cabeça. Uma imbecilidade que faz Candy se sentir intelectual, e ele prova que é tão imbecil quanto sua ciência numa demonstração que talvez seja a melhor cena do filme e da carreira de DiCaprio. Assim como Django, sua composição também fala muito da sua personalidade. Os dentes escuros, de quem já comeu doce demais, dá o ar sombrio e tenebroso que o personagem esconde sob seus bons modos. A cabeça sempre inclinada e o mesmo cavanhaque pontudo e saliente mostram o quanto ele despreza tudo a sua volta e se coloca acima de qualquer pessoa. Uma atuação de gênio, desprezada pelo Oscar.
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